O que um jogo aparentemente inocente está ensinando às crianças
A programação estava para recomeçar. Na parte da manhã, o grupo de pais havia sido receptivo à mensagem. O tempo tinha sido curto, mas suficiente para alertar sobre o perigo que ronda os lares e despertar a atenção para o cuidado que as famílias precisam ter na escolha dos entretenimentos. Na parte da tarde, o plano era que as crianças ficassem em outra sala, assistindo a um filminho, enquanto os pais ouviam a palestra. Um pensamento rápido veio à mente quando o organizador do evento comunicou que já havia uma pessoa destacada para cuidar dos pequenos. “O que acha de deixá-los aqui?”, perguntei. Ele me olhou meio assustado. “Não creio que vai dar certo”, foi a resposta. Não me dei por vencida e insisti: “Podemos pelo menos tentar? Se não funcionar, seguimos o plano original.” Quando ele concordou, pedi apenas que fossem colocadas cadeiras nas primeiras fileiras e elas ficassem bem próximas a mim. Era a primeira vez que eu fazia isso. Fiz uma oração silenciosa e pedi apenas sabedoria para conduzir a situação.
Uma das meninas se aproximou timidamente e perguntou se poderia fazer a oração inicial. Na verdade, ela queria cantar a Ave Maria; me contou orgulhosa que tinha aprendido na escola. Eu não queria frustrá-la, então perguntei: “O que mais você aprendeu lá? Sabe o Pai Nosso?” Ela abriu um sorriso e disse que sim. Depois que todos fizeram silêncio, ouvimos a doce voz infantil declamar a Oração do Senhor, preparando o ambiente para o que se tornaria duas horas e meia de uma divertida interação com as crianças, alguns sustos para os pais, e por fim o anúncio de uma notícia surpreendente.
Eu havia combinado com as crianças que iria apresentar alguns jogos, desenhos e filmes que possivelmente elas conheciam bem, e que elas iriam me ajudar a mostrar para os pais algumas coisas que a maioria das pessoas não sabia ou não percebia, mas que eram perigosas nesses passatempos. Elas entraram no clima. Quando mostrei a primeira tela com a imagem do jogo Minecraft, elas ficaram eufóricas e muitas mãozinhas se levantaram. Então comecei a fazer algumas perguntas intencionais. “Quem são os zumbis e esqueletos nesses jogos?” “Tia, são os projetos que não deram certo!” Percebendo que elas estavam comigo, avancei um pouco mais: “E o que se faz quando o jogador precisa se defender, se proteger ou atacar os inimigos?” Outra mãozinha se levantou: “Eu sei, tia, eu sei... Precisa jogar a poção mágica que você consegue na casa da bruxa... Para preparar essa poção, tem que ter o fungo do Nether.” “Ah, é? E onde fica o Nether?”, perguntei. Eu sabia a resposta, mas queria ver até onde as crianças percebiam o que estava explícito no jogo. Quase todas responderam, ingenuamente, ao mesmo tempo: “Nether é o inferno!”
A essa altura os pais já estavam bem assustados, mas ficaram ainda mais quando pedi que as crianças explicassem como o jogador chegava lá. Sem a menor noção do perigo, elas foram contando como os bloquinhos tinham que ser colocados, formando um portal; depois se acendia o fogo roxo, e então havia o ritual de passagem... Nesse momento, interrompi a conversa e pedi licença aos pais para explicar às crianças que eles as amavam tanto que nunca iriam querer que seus filhos atravessassem o portal do inferno, nem mesmo por brincadeira em um jogo “aparentemente” inocente de construção. Deus havia colocado o papai e a mamãe na vida deles para que eles os ajudassem a chegar ao Céu e atravessassem os portões de pérolas. Realmente, há um mundo melhor nos aguardando, e ele não fica na superfície. Amados como somos por Deus, Ele não nos criaria para viver em um submundo. Era só pensar um pouco. Quem, afinal, vive ali?
Por um momento as crianças me olharam confusas. Depois foi como se a ficha tivesse caído. Se elas tinham condições de brincar com um jogo tão complexo, por que não entenderiam explicações tão simples?
A conversa se prolongou e falei sobre outros elementos presentes nos entretenimentos, como os contos de fadas e os super-heróis, e como eles têm desempenhado um papel fundamental na distorção das verdades bíblicas. Achei o máximo quando uma mãe me contou a conversa que ela teve com o filho depois da palestra. Ele deve ter uns sete anos.
“Filho, o que você aprendeu de tudo o que ouviu?”, ela perguntou. E ele respondeu: “Que eles zoam demais com a Palavra de Deus”, e em seguida completou: “Mãe, nós precisamos estudar mais a Bíblia!”
Recentemente, lemos em nosso culto em família o livro A Revolução do Espírito, de Ron Clouzet (CPB). O conteúdo todo é incrível, mas uma declaração em especial do autor chamou minha atenção: “Muitos cristãos, se fossem fazer uma análise objetiva do uso de seu tempo, descobririam que ele se reduz a experiências e atividades inconsequentes, ou até mesmo um tipo de vida que deve causar preocupação. Muito potencial, ao longo das faixas etárias, é hoje mal utilizado, para não dizer desperdiçado. Satanás tem êxito em fazer da raça humana motivo de zombaria, incluindo os cristãos, levando-os a baixar tanto o olhar a ponto de não saberem se a barra [do salto em altura] ainda existe, e muito menos a que altura se encontra” (p. 161).
A experiência nessa igreja tinha grandes chances de ter dado errado. Afinal, não é fácil dizer para as crianças que talvez muitas das coisas que elas têm lido, assistido e jogado podem estar, na verdade, não as distraindo e tornando-as mais espertas, mas sim minando (sem trocadilho) todas as coisas boas que Deus quer que elas aprendam e que vão servir para prepará-las para o breve encontro com Ele.
No fim do programa, fiz o apelo primeiro para as crianças. Com uma linda imagem de Jesus na tela, perguntei se elas gostariam de escolher Jesus. As mãos se levantaram ainda mais rápido dessa vez. Sem eu ter falado nada, elas começaram a ir para a frente, ficando ainda mais perto de mim. “Vamos convidar agora os pais de vocês para que eles também tomem essa decisão?” Os olhinhos delas brilharam quando os pais se colocaram de pé. O garoto que estava mais próximo de mim pediu para fazer a oração. E eu, claro, deixei. Quando terminou a programação, as crianças me cercaram. Algumas me abraçaram tão forte que tive vontade de chorar.
O trabalho com as crianças sempre será recompensado. Afinal, Jesus já havia falado que é delas o reino dos Céus!
(Neila Diniz de Oliveira é professora no departamento infantil e autora do projeto “Resgate de uma Geração”)